Talvez estejamos diante do
Orixá mais cultuado e respeitado no Brasil. Isso porque foi ele o primeiro Deus
Iorubano, por assim dizer, que pisou em terras brasileiras.
Xangô é um Orixá bastante
popular no Brasil e às vezes confundido como um Orixá com especial ascendência
sobre os demais, em termos hierárquicos. Essa confusão acontece por dois
motivos: em primeiro lugar, Xangô é misticamente um rei, alguém que cuida da
administração, do poder e, principalmente, da justiça - representa a autoridade
constituída no panteão africano. Ao mesmo tempo, há no norte do Brasil diversos
cultos que atendem pelo nome de Xangô. No Nordeste, mais especificamente em
Pernambuco e Alagoas, a prática do candomblé recebeu o nome genérico de Xangô,
talvez porque naquelas regiões existissem muitos filhos de Xangô entre os
negros que vieram trazidos da África. Na mesma linha de uso impróprio, pode-se
encontrar a expressão Xangô de Caboclo, que se refere obviamente ao que
chamamos de Candomblé de Caboclo.
Xangô é pesado, íntegro,
indivisível, irremovível; com tudo isso, é evidente que certo autoritarismo
faça parte da sua figura e das lendas sobre suas determinações e desígnos,
coisa que não é questionada pela maior parte de seus filhos, quando inquiridos.
Suas decisões são sempre
consideradas sábias, ponderadas, hábeis e corretas. Ele é o Orixá que decide
sobre o bem e o mal. Ele é o Orixá do raio e do trovão.
Na África, se uma casa é atingida
por um raio, o seu proprietário paga altas multas aos sacerdotes de Xangô, pois
se considera que ele incorreu na cólera do Deus. Logo depois os sacerdotes vão
revirar os escombros e cavar o solo em busca das pedras de raio formado pelo
relâmpago. Pois seu axé está concentrado genericamente nas pedras, mas,
principalmente naquelas resultantes da destruição provocada pelos raios, sendo
o Meteorito é seu axé máximo.
Xangô tem a fama de agir
sempre com neutralidade (a não ser em contendas pessoais suas presentes nas
lendas referentes a seus envolvimentos amorosos e congêneres). Seu raio e
eventual castigo são o resultado de um quase processo judicial, onde todos os
prós e os contras foram pensados e pesados exaustivamente. Seu Axé, portanto
está concentrado nas formações de rochas cristalinas, nos terrenos rochosos à
flor da terra, nas pedreiras, nos maciços. Suas pedras são inteiras, duras de
quebrar, fixas e inabaláveis, como o próprio Orixá.
Xangô não contesta o status
de Oxalá de patriarca da Umbanda, mas existe algo em comum entre ele e Zeus, o
deus principal da rica mitologia grega. O símbolo do Axé de Xangô é uma espécie
de machado estilizado com duas lâminas, o Oxé,
que indica o poder de Xangô, corta em duas direções opostas. O administrador da
justiça nunca poderia olhar apenas para um lado, defender os interesses de um
mesmo ponto de vista sempre. Numa disputa, seu poder pode voltar-se contra
qualquer um dos contendores, sendo essa a marca de independência e de
totalidade de abrangência da justiça por ele aplicada. Segundo Pierre Verger,
esse símbolo se aproxima demais do símbolo de Zeus encontrado em Creta. Assim
como Zeus, é uma divindade ligada à força e à justiça, detendo poderes sobre os
raios e trovões, demonstrando nas lendas a seu respeito, uma intensa atividade
amorosa.
Outra informação de Pierre
Verger especifica que esse Oxé parece
ser a estilização de um personagem carregando o fogo sobre a cabeça; este fogo
é, ao mesmo tempo, o duplo machado, e lembra, de certa forma a cerimônia chamada
ajerê, na qual os iniciados de Xangô
devem carregar na cabeça uma jarra cheia de furos, dentro da qual queima um
fogo vivo, demonstrando através dessa prova, que o transe não é simulado.
Xangô, portanto, já é adulto
o suficiente para não se empolgar pelas paixões e pelos destemperos, mas vital
e capaz o suficiente para não servir apenas como consultor.
Outro dado saliente sobre a
figura do senhor da justiça é seu mau relacionamento com a morte. Se Nanã é
como Orixá a figura que melhor se entende e predomina sobre os espíritos de
seres humanos mortos, Eguns, Xangô é que mais os detesta ou os teme. Há quem
diga que, quando a morte se aproxima de um filho de Xangô, o Orixá o abandona,
retirando-se de sua cabeça e de sua essência, entregando a cabeça de seus
filhos a Obaluaiê e Omulu sete meses antes da morte destes, tal o grau de
aversão que tem por doenças e coisas mortas.
Deste tipo de afirmação
discordam diversos babalorixás ligados ao seu culto, mas praticamente todos
aceitam como preceito que um filho que seja um iniciado com o Orixá na cabeça,
não deve entrar em cemitérios nem acompanhar a enterros.
Tudo que se refere a
estudos, as demandas judiciais, ao direito, contratos, documentos trancados,
pertencem a Xangô.
Xangô teria como seu ponto
fraco, a sensualidade devastadora e o prazer, sendo apontado como uma
figura vaidosa e de intensa atividade sexual em muitas lendas e cantigas, tendo
três esposas: Obá, a mais velha e menos amada; Oxum, que era casada com Oxóssi
e por quem Xangô se apaixona e faz com que ela abandone Oxóssi; e Iansã, que
vivia com Ogum e que Xangô raptou.
No aspecto histórico Xangô
teria sido o terceiro Aláàfin Òyó, filho de Oranyan e Torosí, e teria reinado
sobre a cidade de Òyó (Nigéria), posto que conseguiu após destronar o próprio
meio-irmão Dada-Ajàká com um golpe militar. Por isso, sempre existe uma aura de
seriedade e de autoridade quando alguém se refere a Xangô.
Conta à lenda que ao ser
vencido por seus inimigos, refugiou-se na floresta, sempre acompanhado da fiel
Iansã, enforcou-se e ela também. Seu corpo desapareceu debaixo da terra num
profundo buraco, do qual saiu uma corrente de ferro - a cadeia das gerações
humanas. E ele se transformou num Orixá. No seu aspecto divino, é filho de
Oxalá, tendo Yemanjá como mãe.
Xangô também gera o poder da
política. É monarca por natureza e chamado pelo termo obá, que significa Rei. No dia-a-dia encontramos Xangô nos fóruns,
delegacias, ministérios políticos, lideranças sindicais, associações,
movimentos políticos, nas campanhas e partidos políticos, enfim, em tudo que
gera habilidade no trato das relações humanas ou nos governos, de um modo
geral.
Xangô é a ideologia, a
decisão, à vontade, a iniciativa. É a rigidez, organização, o trabalho, a
discussão pela melhora, o progresso social e cultural, a voz do povo, o
levante, à vontade de vencer. Também o sentido de realeza, a atitude imperial,
monárquica. É o espírito nobre das pessoas, o chamado “sangue azul”, o poder de liderança. Para Xangô, a justiça está
acima de tudo e, sem ela, nenhuma conquista vale a pena; o respeito pelo Rei é
mais importante que o medo.
Xangô é um Orixá de fogo.
Diz à lenda que ele foi rei de Òyó. Rei poderoso e orgulhoso e teve que
enfrentar rivalidades e até brigar com seus irmãos para manter-se no poder.
Kaô Kabecilê
Kaô Kabecilê
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