segunda-feira, 12 de março de 2012

As Diferenças Entre As Nações

Como se sabe, muitas são as formas existentes de culto no Brasil que se utilizam da denominação Candomblé. Isto se dá pela grande variedade de etnias de negros, que reduzidos à condição de escravos, chegaram ao nosso país. Cada grupo/etnia que aqui aportou pertencia a locais distintos na África, tendo assim, costumes e culturas diferenciadas. Assim, portanto, chegaram daometanos, yorubás, congolenses, angolanos, malês e inúmeros outros grupos, que em terras brasileiras procuraram manter seus hábitos, sua cultura e também seus ritos religiosos. Daí surgiram às nações de candomblé, ou seja, a prática do candomblé conforme ritos específicos da origem do povo praticante, como a nação de Ketu, a nação Jêje, a nação Efón, Angola e Kongo (atualmente, estas duas últimas, consideram-se fundidas dada a grande semelhança das práticas religiosas e a proximidade das línguas utilizadas, que são respectivamente, o Kimbundo e o Kikongo). Portanto, cada nação de candomblé possui características próprias, que a diferencia das demais. Estas diferenças se encontram na língua utilizada, nas divindades cultuadas, em determinadas práticas de caráter sigiloso (fundamento), no modo de se enxergar determinadas questões, enfim, numa série de fatores distintivos.
Abaixo algumas diferenças entre as Nações Angola, Jêje e Ketu.
A primeira e primordial diferença entre as citadas nações de candomblé se encontra com relação às divindades, objeto do culto. Assim:
Mukixes para os Angolanos;
Inkices para os Congolenses;
Orixás para os Yorubás (Nação Ketu), e;
Voduns para os Daometanos (Nação Jêje).
Outra diferença encontrada, dentre muitas, é a variação do idioma/língua/dialeto utilizado em cada vertente, assim:
Kimbundo para os Angolanos;
Kikongo para os Congolenses;
Yorubá para os Yorubás, e;
Éwé-fon para os Daometanos.
Distinguem-se ainda pelo próprio ritmo dos atabaques, pelas denominações que cada nação dá a estes, ou mesmo pela maneira de tocá-los, assim teremos:
Kongo de Ouro, Barra Vento e Kabula para as tradições Bantu (Angola e Kongo), ritmos estes, obtidos através do toque com as mãos. Sendo denominados, os atabaques, simplesmente de engomas ou "ngomas".
Ijexá, Igbin, Aguerê, Bravum, Opanijé, Alujá, Adahun e Avamunha para as tradições Yorubás e Daometanas. As denominações dos atabaques para os últimos (Jêjes) são: rum, rumpi e lé (os atabaques nesta cultura diferem-se das demais até mesmo no formato, pois são acomodados em suportes na posição horizontal, diferentemente das demais tradições); Para os primeiros (Yorubás), os atabaques são chamados de ilubatás ou ilús, sendo tocados com a ajuda de varetas (aguidavi) e não diretamente com as mãos (exceto o Ijexá, que se utiliza também do toque com as mãos). Embora em muitas casas de diferentes nações e comum as corimbas serem chamados como na nação Jêje.

Candomblé de Angola
Religião afro-brasileira, de origem banto, que compreende as nações de Angola e Congo (Cassanges, Kikongos, Kimbundo, M´bundo e Kiocos), e se desenvolveu entre os escravos africanos que falavam a linguagem Kimbundo e Kikongo e são facilmente reconhecidos pela maneira diferente de cantar, dançar e percutir seus tambores.
Na hierarquia de Angola o cargo de maior importância é para homem Tata Nkisi (tata de inquinces) e para mulher Mametu Nkisi (Mametu de inquices), que correspondem ao Babalorixá e a Yalorixá dos Yorubás, e o Deus supremo é Zambi (Nzambi) ou Zambiapongo (Ndala Karitanga).
O Candomblé de Caboclo é uma modalidade desta nação, e cultua os antepassados. Há uma nação que faz parte do Batuque do Rio Grande do Sul que descende de Angola, que é a Cabinda.
Os rituais da nação Angola começam com o Massangá, que é o batismo na cabeça do iniciado, feito com água doce e Obí; Bori com sacrifício de animais para o uso do sangue (menga); ritual de raspagem, conhecido como feitura de santo; ritual de obrigação de 1 ano; ritual de obrigação de 3 anos, onde muda o grau de iniciação; ritual de obrigação de 5 anos, com o uso de frutas, obrigação de 7 anos, quando o iniciado recebe seu cargo, é elevado ao grau de Tata Nkisi (zelador) ou Mametu Nkisi (zeladora). Após 7 anos de obrigações, será renovado a cada ano com o rito de Obí ou Bori, conforme o caso, e de 7 em 7 anos se repete as obrigações para conservar o individuo forte, se transformando em “Kukala Ni Nguzu”, que quer dizer um ser forte.
Em frente a toda casa de Candomblé Angola existe um mastro com uma bandeira branca que representa a nação.
Mukuiú N´zambi
Candomblé Djedje
Dahomé, o berço da nação Éwé e Fon, denominados Djedjes, no Brasil, enumeram-se em diversas tribos como os Agonis, Axântis, Gans-Crus, Popós etc. Os primeiros povos djedjes tiveram como destino São Luís do Maranhão, onde ainda se mantém vivas as tradições religiosas trazidas da terra mãe, África. Também se encontra o ritual djedje em Salvador, Cachoeira de São Félix, Pernambuco entre outros estados do Brasil como Rio Grande do Sul e São Paulo, que também importou os rituais desta nação.
O negro descendente do Dahomé, hoje Benin, trouxe consigo o culto à suas divindades chamadas Voduns, cujo Deus Supremo é Mawu, a quem são subordinados, assim como Olódúmarè o Deus Supremo dos Orixás Yorubás. Diz a Mitologia Fon que Mawu tinha um companheiro chamado Lissá. Mawu era a Lua, que teve força ao longo da noite e viveu no oeste. Lissá era o Sol, que fez sua morada no Leste. Quando existia um eclipse dizia-se que Mawu e Lisa estavam fazendo amor. Eles eram pais de todos os outros Deuses. E existem catorze destes deuses, que eram sete pares de gémeos. Este relato é um mito do primeiro povo do Dahomé, os Fons.
O culto aos Voduns teve ênfase na Bahia, conhecido como Candomblé Djedje, e no Maranhão Tambor de Mina.
Algumas casas de djedje tiveram influencias dos yorubás e vice-versa, formando o que se chama de cultura Djedje-Nagô. A exemplo do candomblé, as instalações dos terreiros contam com um barracão central para as danças, pequenas casas reservadas para as diferentes famílias de divindades, onde são mantidos os assentamentos, há uma cozinha, quartos para dormir e se vestir e quarto onde os iniciados ficam recolhidos durante as obrigações. Há também a casa de Legba, onde são feitas grandes obrigações.
A iniciação djedje requer um longo período de confinamento, que pode durar de seis meses a um ano de reclusão, onde um Vodunsi aprende as tradições religiosas djedje como: danças, cantigas, preparo das comidas sagradas, cuidar de árvores e espaços sagrados, votos de segredo e obediência. As entidades são assentadas, recebem sacrifícios de animais, comidas, bebidas e outros presentes. Os assentamentos são preparados em pedras, que representam um “imã” que tem a força do Vodun, e ficam guardadas no quarto de segredo recobertos com jarras, louças e ferramentas. Existem, também, assentamentos em outras partes da casa e do quintal marcados por árvores como a cajazeira, ginja e pinhão branco. É comum ter assentamentos no centro do barracão de danças; assim como em outras nações, no culto djedje também são feitos rituais de limpezas, banhos com ervas e muitas preces.
Mawu é o ser supremo dos povos Éwé e Fon, criador do mundo, dos seres vivos e das divindades. Mawu (feminino) e Lissá (masculino) formam a divindade dupla Mawu-Lissá cujos Voduns são filhos e descendentes de ambos. Os principais Voduns são: Loko; Gu; Heviossô; Sakpatá; Dan; Agbê; Águé; Ayizan; Agassu; Legba e Fa.
            Kolofé Olorun
Candomblé de Ketu/Nagô
Ketu é o nome de um antigo reino da África, na região agora ocupada pela República Popular do Benin e pela Nigéria. Seu rei tem o nome de Alaketu, de onde vem o sobrenome da conhecida Yalorixá Olga de Alaketu. Também indica o nome do povo dessa região, que veio como escravo para o Brasil. Em termos de identidade cultural, forma uma subdivisão da cultura iorubana. Em geral, membros de origem ketu são responsáveis por boa parte dos terreiros mais tradicionais da Bahia.
A diferença entre as outras nações está no idioma utilizado, no caso o Yorubá, no toque dos seus atabaques, nas cores e símbolos dos Orixás, e nas cantigas; Os fundamentos são passados oralmente por sacerdotes de Orixás que são chamados de Babalorixá (masculino) Yalorixá (feminino).
Outra grande diferença é em relação ao culto dos Eguns; existe um sacerdote preparado para este ritual especifico chamado Ojé ou Baba Ojé, que faz o uso de um Ixã (bastão) para dominar os Eguns; conforme informações de um antigo sacerdote de Ketu, chamado Balbino de Xangô, quem lida com Orixás não lida com Eguns; Já no Rio Grande do Sul, é o próprio Sacerdote de orixá quem faz os rituais de Eguns.
Os cargos principais na nação Ketu/Nagô são:
- Babalorixá ou Yalorixá: autoridades máximas no Candomblé
- Iyakekerê: mãe pequena
- Babakekerê: pai pequeno
- Yalaxé: mulher que cuida dos objetos ritual.
- Babalaxé: homem que cuida dos objetos ritual.
- Ajibonã ou jíbonan: mãe/pai criadeira (o) supervisiona e ajuda na iniciação.
- Egbomi: pessoa que já cumpriu sete anos de obrigação.
- Iyabassê: mulher responsável pela preparação das comidas de santo.
- Yawo: filha (o) de santo (que já incorpora Orixá).
- Abiã: novato.
- Axogun: responsável pelo sacrifício de animais.
- Alagbê: responsável pelos atabaques e pelos toques.
- Ogan: tocadores de atabaques.
- Ajoiê ou Ekedi: camareira de Orixá.
Os Orixás cultuados na nação Ketu são: Exu, Ogun, Oxóssi, Logun Edé, Xangô, Obaluàyé, Oxumarê, Ossãe, Oyá, Oxun, Yemanjá, Nanã, Ewá, Oba, Oxalá, Ibeji, Irôko, Orunmilá.
Na nação Ketu, existente principalmente na Bahia, predominam os Orixás de origem Yorubá, e os terreiros mais conhecidos são: a Casa Branca do Engenho Velho, o Ilê Axé Opô Afonjá, o Gantois.
O Candomblé de origem ketu já se espalhou por todos os grandes centros urbanos do Brasil e também para o exterior, e nota-se um movimento de recuperação de raízes africanas, que rejeita o sincretismo católico, procurando reaprender o yorubá como língua original e tenta reproduzir os rituais que estavam perdidos ao longo do tempo, há casos em que muitos sacerdotes procuram viajar até África para descobrir mais sobre a cultura dos Orixás.
Motumbá Asé 

quinta-feira, 1 de março de 2012

Orunmilá-Ifá - O conhecedor do destino


A importância de Orunmilá é tão grande que chegamos a concluir que se um homem fizer algum tipo de pedido ao todo poderoso Olorun (Deus, o Senhor dos Céus), esse pedido só poderá chegar até ele através de Orunmilá e Exú, que são somente eles dois dentre todos os Orixá os que têm a permissão, o poder e o livre acesso concedido pôr Olorun de estar junto a Ele, quando assim for necessário.
Ainda vale ressaltar que somente Orunmilá e Exú possuem para si um culto individual, onde são feitos adorações totalmente específicas para os mesmos. Isso só é possível pôr causa dos poderes delegados pelo todo poderoso a eles, pois os demais Orixás são totalmente dependentes de Ifá e Exú, enquanto que eles não dependem de nenhum dos Orixás para desenvolverem sua própria evolução, ou seja, o culto à Ifá e Exú não dependem do culto aos Orixás, entretanto os cultos aos Orixás dependem totalmente de Ifá e Exú.
Orunmilá é o senhor dos destinos, é aquele que tudo sabe e tudo vê em todos os mundos que estão sob a tutela de Olorun, ele sabe tudo sobre o passado, o presente e o futuro de todos habitantes da Terra e do Céu, é o regente responsável e detentor dos oráculos, foi quem acompanhou Odùduwà na criação e fundação de Ilê Ìfé, é normalmente chamado em suas preces de:
Elérí Ìpín - "o testemunho de Deus''
Ibìkéjì Olódúmarè - "o vice de Deus"
Gbàiyégbòrún - "aquele que está no céu e na terra"
Òpitan Ìfé - "o historiador de Ìfé"
Acredita-se que Olorun passou e confiou de maneira especial toda a sabedoria e conhecimento possível, imaginável e existente entre todos os mundos habitados e não habitados à Orunmilá, fazendo com que desta forma o tornasse seu representante em qualquer lugar que estivesse.


Na Terra Olorun fez com que Orunmilá participasse da criação da terra e do homem, fez com que ele auxiliasse o homem a resolver seus problemas do dia a dia, também fez com que ajudasse o homem a encontrar o caminho e o destino ideal de seu orì. No Céu lhe ensinou todos os conhecimentos básicos e complementares referente todos os Orixá, pois criou um elo de dependência de todos perante Orunmilá, todos devem consultá-lo para resolver diversos problemas, com pôr exemplo, a vinda de Oxalá à terra para efetuar a criação de tudo aquilo que teria vida na mesma, porém o grande Orixá não seguiu as orientações prescritas pôr Ifá, e não conseguiu cumprir com sua obrigação caindo nas travessuras aplicadas pôr Exú, ficando esta missão pôr conta de Odùduwà.
Também Orunmilá fala e representa de maneira completa e geral todos os Orixás, auxiliando pôr exemplo, um consulente no que ele deve fazer para agradar ou satisfazer um determinado Orixá, obtendo desta forma um resultado satisfatório para o Orixá e para o consulente.
Orunmilá sabe e conhece o destino de todos os homens e de tudo o que têm vida em nosso mundo, pois ele está presente no ato da criação do homem e sua vinda a terra, e é neste exato instante que Ifá determina os destinos e os caminhos a serem cumpridos pôr aquele determinado espírito.
É pôr isso que Orunmilá tem as respostas para toda e qualquer pergunta lhe é feita, e que ele têm a solução para todo e qualquer problema que lhe é apresentado, e é pôr esta razão que ele têm o remédio para todas as doenças que lhe forem apresentadas, pôr mais impossível que pareça ser a sua cura.
Todos nós deveríamos consultar Ifá antes de tomarmos qualquer atitude e decisão em nossas vidas, com certeza iríamos errar menos, os Iorubás consultam Ifá antes de tomarem qualquer decisão, com pôr exemplo, antes de um casamento, antes de um noivado, antes do nascimento e até mesmo na hora de dar o nome a criança, antes da conclusão de um negócio, antes de uma viagem, etc.
Além disto, tudo, Orunmilá é também quem tem a vida e a morte em suas mãos, pois ele é a energia que esta mais atuante e mais próxima de Olorun, podendo ele ser a única entidade que tem poderes para suplicar, pedir ou implorar a mudança do destino de uma pessoa.
Cada indivíduo nasce ligado a um Odú, que dá a conhecer sua identidade profunda, servindo-lhe de guia por toda vida, revelando-lhe o Orixá particular, ao qual deverá ser eventualmente dedicado.

            Exeu, Epá Oju Olorun!

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Kavungo - Da peste a cura


O culto feito a Kavungo, que se desdobra com o nome de Obaluàyé / Omolu. Orixá originário do Daomé, Obaluàyé ("Rei Dono da Terra") ou Omolu ("Filho do Senhor") É um Orixá sombrio, tido entre os iorubanos como severo e terrível, caso não seja devidamente cultuado, porém Pai bondoso e fraternal para aqueles que se tornam merecedores, através de gestos humildes, honestos e leais.
Obaluàyé, o Rei da Terra, é filho de Nanã, mas foi criado por Iemonjá que o acolheu quando a mãe rejeitou-o por ser manco feio e coberto de feridas. É uma divindade da terra dura, seca e quente. É às vezes chamado "o velho", com todo o prestígio e poder que a idade representa no Candomblé. Está ligado ao Sol, propicia colheitas e ambivalentemente detém a doença e a cura. Com seu Xaxará (feixe de ramos de palmeira enfeitado com búzios), ele expulsa a peste e o mal. Mas a doença pode ser também a marca dos eleitos, pelos quais Omolu quer ser servido. Quem teve varíola é frequentemente consagrado a Omolu, que é chamado "médico dos pobres".
Suas relações com os Orixás são marcadas pelas brigas com Xangô e Ogum e pelo abandono que os Orixás femininos legaram-lhe. Rejeitado primeiramente pela mãe, segue sendo abandonado por Oxum, por quem se apaixonou que, juntamente com Iansã, troca-o por Xangô. Finalmente Obá, com quem se casou, foi roubada por Xangô.
Omolu é considerado o Orixá da morte, aquele que leva os espíritos dos enfermos. É responsável pela transição do espírito, do plano material para o plano espiritual. Assim como é responsável pela vinda da morte, também é responsável pela ida, sendo assim atribuída a ele várias curas.
Obaluàyé é considerado um Orixá de amor, responsável pela recuperação dos espíritos que, no plano material, cometeram muitos erros, os espíritos decaídos, cuidando da transição desses espíritos para o plano espiritual. Ele também é capaz de tirar as enfermidades dos doentes. Também prepara para o renascimento, cuidado o útero da mulher para receber a nova vida.
Ambos os nomes surgem quando nos referimos a esta figura, seja Obaluàyé seja Omolu. Para a maior parte dos devotos do Candomblé e da Umbanda, os nomes são praticamente intercambiáveis, referentes a um mesmo arquétipo e, correspondentemente, uma mesma divindade. Já para alguns babalorixás, porém, há de se manter certa distância entre os dois termos, uma vez que representam tipos diferentes do mesmo Orixá.


São também comuns as variações gráficas Obaluaê e Abaluaê.
Tem o rosto e o corpo cobertos de palha da costa, em algumas lendas para esconder as marcas da varíola, em outras já curado não poderia ser olhado de frente por ser o próprio brilho do sol.
Em termos mais estritos, Obaluàyé é a forma jovem do Orixá Xapanã, enquanto Omolu é sua forma velha. Como, porém, Xapanã é um nome proibido tanto no Candomblé como na Umbanda, não devendo ser mencionado, pois pode atrair a doença inesperadamente.
Em algumas narrativas mais tradicionalistas tentam apontar-se que o conceito original da divindade se referia ao deus da varíola, tal visão, porém, é uma evidente limitação. A varíola não seria a única doença sob seu controle, simplesmente era a epidemia mais devastadora e perigosa que conheciam os habitantes da comunidade original africana, onde surgiu Obaluàyé, o Daomé.
Assim, sombrio e grave como Irôko, Oxumarê (seus irmãos) e Nanã (sua Mãe), Obaluàyé é uma criatura da cultura jêje, posteriormente assimilada pelos yorubás. Enquanto os Orixás iorubanos são extrovertidos, de têmpera passional, alegres, humanos e cheios de pequenas falhas que os identificam com os seres humanos, as figuras daomeanas estão mais associadas a uma visão religiosa em que distanciamento entre deuses e seres humanos é bem maior. Quando há aproximação, há de se temer, pois alguma tragédia está para acontecer, pois os Orixás do Daomé são austeros no comportamento mitológico, graves e consequentes em suas ameaças.
A visão de Obaluàyé é a do castigo. Se um ser humano falta com ele ou um filho-de-santo seu é ameaçado, o Orixá castiga com violência e determinação, sendo difícil uma negociação ou um aplacar, mais prováveis nos Orixás yorubás.
Pierre Verger, nesse sentido, sustenta que a cultura do Daomé é muito mais antiga que a yorubá, o que pode ser sentido em seus mitos: A antiguidade dos cultos de Obaluàyé e Nanã, frequentemente confundidos em certas partes da África, é indicada por um detalhe do ritual dos sacrifícios de animais que lhe são feitos. Este ritual é realizado sem o emprego de instrumentos de ferro, indicando que essas duas divindades faziam parte de uma civilização anterior à Idade do Ferro e à chegada de Ogum

Atotô Ajuberô!

Vunji - A inocência das crianças


Vungi – na nação Angola e Congo; ou Ìbejî – na Nação Ketu; o único Orixá permanentemente duplo. É formado por duas entidades distintas e sua função básica é indicar a contradição, os opostos que coexistem. Num plano mais terreno, por ser criança. A ele é associado a tudo o que se inicia: a nascente de um rio, o germinar das plantas, o nascimento de um ser humano.
Vungi está presente em todos os rituais do candomblé e umbanda, pois, assim com Exu, se não for bem cuidado, pode atrapalhar os trabalhos, com suas brincadeiras infantis, desvirtuando a concentração dos membros de uma Casa de Santo.
 Companheiro inseparável de Lógunèdè e Ewá formam um trio de muita bagunça, de alegria, felicidade e, principalmente, beleza. O Orixá criança. É a divindade da brincadeira, da alegria; sua regência está ligada à infância.
Discute-se, ainda hoje, sobre os fundamentos deste Orixá. Dizem que estão perdidos, pois se trata de uma divindade raríssima e até mesmo pouco conhecida no Brasil. São gêmeos, duplos e têm o sincretismo de Cosme e Damião; e Crispim e Crispiniano, tão cultuado em  terras brasileiras.
Sua determinação é tomar conta do bebê até a adolescência, independente do orixá que a criança carrega. Ibeji é tudo de bom, belo e puro que existe; uma criança pode nos mostrar seu sorriso, sua alegria, sua felicidade, seu engatinhar, falar, seus olhos brilhantes.


Na natureza, a beleza do canto dos pássaros, nas evoluções durante o voo das aves, na beleza e perfume das flores. A criança que temos dentro de nós, as recordações da infância. Feche os olhos e lembre-se de uma felicidade, de uma travessura e você estará vivendo ou revivendo uma lenda dessa divindade. Pois tudo aquilo de bom que nos aconteceu em nossa infância, foi regido, gerado e administrado por Ibeji. Portanto, ele já viveu todas as felicidades e travessuras que todos nós, Erês humanos, vivemos.
A palavra Erê vem do yorubá, iré, que significa "brincadeira, divertimento". Daí a expressão siré que significa “fazer brincadeiras”. O Erê (não confundir com criança que em yorubá é omodé) aparece instantaneamente logo após o transe do orixá, ou seja, o Erê é o intermediário entre o iniciado e o orixá. Durante o ritual de iniciação, o Erê é de suma importância, pois, é o Erê que muitas das vezes trará as várias mensagens do orixá do recém-iniciado.
O Erê na verdade é a inconsciência do novo omon-orixá, pois o Erê é o responsável por muita coisa e ritos passados durante o período de reclusão. O Erê conhece todas as preocupações do iyawô (filho), também, aí chamado de omon-tú ou “criança-nova”. O comportamento do iniciado em estado de “Erê” é mais influenciado por certos aspectos de sua personalidade, que pelo caráter rígido e convencional atribuído a seu orixá.

Erê mi ô, oni Ìbejî, beje erô!

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Katendê - O senhor das folhas

É fundamental sua importância, porque detêm o reino e poder das plantas e folhas, imprescindíveis nos rituais e obrigações de cabeça e assentamento de todos os Orixás através dos banhos feitos de ervas. Como as folhas estão relacionadas com a cura, Ossain também está vinculado à medicina, por guardar escondida na sua floresta a magia da cura para todas as doenças dos homens, contida nas virtudes de todas as folhas. A cura é invocada no caso de doença, com o auxílio de Obaluaiê.
Divindade Masculina, do ar livre, que governa toda a floresta, juntamente com Oxóssi, dono do mistério das folhas e seu emprego medicinal ou sua utilização mágica. Dono do axé (força, poder, fundamento, vitalidade e segurança) existentes nas folhas e nas ervas, ele não se aventura nos locais onde o homem cultivou a terra e construiu casas, evitando os lugares onde a mão do homem poluiu a natureza com o seu domínio.
É bastante cultuado no Brasil, sendo conhecido por diversos nomes, Ossonhe, Ossain e Ossanha, a forma mais popular. Por causa do som final da palavra, é frequentemente confundido com uma figura feminina.
É o Orixá da cor verde, do contato mais íntimo e misterioso com a natureza. Seu domínio estende-se ao reino vegetal, às plantas, mais especificamente às folhas, onde corre o sumo. Por tradição, não são consideradas adequadas pelo Candomblé mais conservador, as folhas cultivadas em jardins ou estufas, mas as das plantas selvagens, que crescem livremente sem a intervenção do homem. Não é um Orixá da civilização no sentido do desenvolvimento da agricultura, sendo como Oxóssi, uma figura que encontra suas origens na pré-história.
As áreas consagradas a Ossain nos grandes Candomblés, não são jardins cultivados de maneira tradicional, mas sim os pequenos recantos, onde só os sacerdotes (mão de ofá) podem entrar, nos quais as plantas crescem da maneira mais selvagem possível. Graças a esse domínio, Ossain é figura de extrema significação, pois praticamente todos os rituais importantes utilizam de uma maneira ou de outra, o sangue escuro que vem dos vegetais, seja em forma de folhas ou infusões para uso externo ou de bebida ritualística.
Quando os Zeladores (as) de Santo penetram no reino de Ossain para fazerem as colheitas das ervas sagradas para os banhos e defumações, devem antes pedir a Ossain permissão para tal tarefa, pois se não o fizerem, com certeza todas as folhas que retirarem de seu Reino, não terá os Axés e Magias que teriam se pedissem a sua permissão, e até dependendo do caso como alguns entram em seu Reino zombando e sem firmeza de cabeça, suas ervas poderão agir ao contrario, causando muitos distúrbios naqueles que zombarem de seu Reino e faltarem com o devido respeito ao seu domínio. Junto á planta cortada, deixa-se sempre a oferenda de algumas moedinhas e um pedaço de fumo-de-corda com mel, assim assegurando que a vibração básica da folha permaneça, mesmo depois de ela ter sido afastada da planta e, portanto do solo que a vitalizava.



As folhas e ervas de Ossain, depois de colhidas são esfregadas, espremidas e trituradas com as mãos, e não com pilão ou outro instrumento. Cumpre quebrá-las vivas entre os dedos.
Seja filho de Oxalá ou de Nanã, ou de qualquer outro Orixá, uma pessoa sempre tem de invocar a participação de Ossain ao utilizar uma planta para fins ritualísticos, pois, a capacidade de retirar delas sua força energética básica, continua sendo segredo de Ossain. Por isso não basta possuir a planta exigida como ingrediente de um prato a ser oferecido ao Orixá, ou de qualquer outra forma de trabalho.
A Colheita das folhas já é completamente ritualizada, não se admitindo uma folha colhida de maneira aleatória. Para que um iniciado possa recolher as ervas necessárias ao culto a ser realizado, deve-se abster de qualquer bebida alcoólica e de relações sexuais na noite que precede a colheita. As folhas devem ser colhidas na floresta virgem, sempre que possível. Antes de penetrar na mata, o iniciado deve pedir licença a Oxóssi e a Ossain, para isso acender vela na entrada, com o cuidado de limpar a área onde ficarão as velas.
Toda vez que queimamos uma floresta, desmatamos, cortamos árvores, ou simplesmente arrancamos folhas desnecessariamente, estamos violando a natureza, ofendendo seriamente essa força natural que denominamos Ossain.
E é por este motivo que devemos respeitar nossas florestas, bosques, matas, enfim todo espaço em que tenha uma planta, mesmo sabendo que Ossain habita as florestas e matas fechadas, mas toda planta leva em sua essência o Axé deste Orixá da cura.
Ossain tem uma aura de mistério em torno de si e a sua especialidade, apesar de muito importante, não faz parte das atividades cotidianas, constituindo-se mais numa técnica, um ramo do conhecimento que é empregado quando necessário o uso ritualístico das plantas para qualquer cerimônia litúrgica, como forma condutora da busca do equilíbrio energético, de contato do homem com a divindade.
O símbolo de Ossain é uma haste de ferro de cuja extremidade superior partem sete pontas dirigidas para o alto. A do centro é encimada pela imagem de um pássaro.
Ossain é o companheiro constante de Ifá. É representado por uma sineta de ferro forjado, terminada por uma haste pontuda enfiada em uma grande semente. A haste é fincada no chão. Por sua presença, Ossain traz a influência das folhas para as operações da adivinhação.

Ewê ewê asá!

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Lógunèdè - O príncipe sem mãe


Lógunèdè é filho de Oxóssi e de Oxum. É mulher durante seis meses, vivendo na água, e nos outros seis meses é homem, vivendo no mato, propicia a caça e a pesca. Quando em seu aspecto feminino, veste-se com saia cor-de-rosa, usa uma coroa de metal dourado (não o Adé das rainhas), um arco e uma flecha. Com seu aspecto masculino usa capacete de metal dourado, capangas, arco e flecha ou espada. Só se veste com cores claras. Sempre acompanha na dança Oxum e Oxóssi.
Um Orixá essencialmente Ijexá (da Nigéria). Caçador e pescador. Sendo filho de Oxóssi e Oxum, assume características de ambos. É dito que ele vive metade do ano nas matas - domínio do pai, comendo caça; e a outra metade nas águas doces - domínio da mãe, comendo peixe.
No Brasil tem numerosos adeptos. Lógunèdè é o ponto de encontro entre os rios e florestas, as barrancas, beiras de rios, e também o vapor fino sobre as lagoas, que se espalha nos dias quentes pelas florestas. Lógunèdè representa o encontro de naturezas distintas sem que ambas percam suas características. É filho de Oxóssi Inlè com Oxum Yeye Pondá. Assim, tornou-se o amado, doce e respeitado príncipe das matas e dos rios, e tudo que alimenta os homens, como as plantas, peixes e outros animais, sendo considerado então o dono da riqueza e da beleza masculina.
É considerado o príncipe dos orixás. Tem a astúcia dos caçadores e a paciência dos pescadores como principais virtudes.
Dizem os mitos que sendo Oxóssi e Oxum extremamente vaidosos, não puderam viver juntos, pois competiam pelo prestígio e admiração das pessoas e terminaram separando-se. Ficou combinado entre eles que Lógunèdè viveria seis meses nas águas dos rios com Oxum e seis meses nas matas, com seu pai Oxóssi. Ambos ensinariam a Lógunèdè a natureza dos seus domínios. Ele seria poderoso e rico, além de belo.


No entanto, o hábito da espreita aprendido com seu pai, fez com que, um dia, curioso a respeito da beleza do corpo de sua mãe, de que tanto se falava nos reinos das águas, Lógunèdè vestindo-se de mulher fosse espiá-la no banho. Como Oxum estivesse vivendo seu romance com Xangô, tio de Lógunèdè, e Xangô tivesse exigido como condição do casamento que ela se livrasse de Lógunèdè, Oxum aproveitou a oportunidade para punir Lógunèdè com sua transformação num orixá meji (orixá duplo) e abandoná-lo na beira do rio. Iansã o encontra, e fascinada pela beleza da criança leva Lógunèdè para casa onde, juntamente com Ogum, passa a criá-lo e educá-lo.
Com Ogum Lógunèdè aprendeu a arte da guerra e da forja e com Iansã o amor à liberdade. Diz o mito que Lógunèdè tinha tudo, menos amor das mulheres, pois mesmo Iansã, quando roubada de Ogum por Xangô, abandona Lógunèdè com seu tio, criando assim um profundo antagonismo entre Xangô e Lógunèdè, já que por duas vezes Xangô lhe tira a mãe.
Lógunèdè nunca se casou, devido a seu caráter infantil e duplo e sua companhia predileta é Ewá, que também vive, como ele, solitária e no limite de dois mundos diferentes.
Possui o conhecimento dos elementos da natureza, onde reinam seus pais, como florestas, matas, rios, cachoeiras, etc. Seu próprio domínio está situado nas margens de rios, córregos e cursos d’água em geral, desde que tenham vegetação, ou seja, o encontro dos dois reinados.
Na verdade, esse orixá tem livre acesso aos dois reinados, adquirindo o conhecimento de ambos. Consegue adaptar-se, com facilidade, aos mais diversos ambientes, agindo e comportando-se de diferentes formas, dependendo da situação.
Ele herdou, também, muitas das características de seus pais, como a habilidade de caçar e conseguir fortuna, o encanto e a beleza, bem como um grande conhecimento de feitiçaria, como sua mãe. Além desses atributos, é, também, responsável pela fertilização das terras, através da irrigação, contribuindo, assim, com a agricultura.
Esse orixá possui muita riqueza e sabedoria, não admitindo a imperfeição em suas oferendas e rituais. Tem aparência doce e calma, mas, quando contrariado, torna-se muito enfurecido.
Outra característica de Lógunèdè é a de importar-se com o sofrimento dos outros, distribuindo riquezas e caças para os que não têm. 

Lossi lossi Logun Edé!

Hongolo - A cobra sagrada


Oxumarê filho mais novo e preferido de Nanã, irmão de Omulu. É uma entidade branca muito antiga, participou da criação do mundo enrolando-se ao redor da terra, reunindo a matéria e dando forma ao Mundo. Sustenta o Universo, controla e põe os astros e o oceano em movimento. Rastejando pelo Mundo, desenhou seus vales e rios. É a grande cobra que morde a cauda, representando a continuidade do movimento e do ciclo vital. A cobra é dele e é por isso que no Candomblé não se mata cobra. Sua essência é o movimento, a fertilidade, a continuidade da vida.
A comunicação entre o céu e a terra é garantida por Oxumarê. Leva a água dos mares, para o céu, para que a chuva possa formar-se - é o arco-íris, a grande cobra colorida. Assegura comunicação entre o mundo sobrenatural, os antepassados e os homens e por isso a associa do ao cordão umbilical.
Oxumarê é um Orixá bastante cultuado no Brasil, apesar de existirem muitas confusões a respeito dele, principalmente nos sincretismos e nos cultos mais afastados do Candomblé tradicional africano como a Umbanda. A confusão começa a partir do próprio nome, já que parte dele também é igual ao nome do Orixá feminino Oxum, a senhora da água doce. Algumas correntes da Umbanda, inclusive, costumam dizer que Oxumarê é uma das diferentes formas e tipos de Oxum, mas no Candomblé tradicional tal associação é absolutamente rejeitada. São divindades distintas, inclusive quanto aos cultos e à origem.
Em relação à Oxumarê, qualquer definição mais rígida é difícil e arriscada. Não se pode nem dizer que seja um Orixá masculino ou feminino, pois ele é as duas coisas ao mesmo tempo; metade do ano é macho, a outra metade é fêmea. Por isso mesmo a dualidade é o conceito básico associado a seus mitos e a seu arquétipo.
Essa dualidade onipresente faz com que Oxumarê carregue todos os opostos e todos os antônimos básicos dentro de si: bem e mal, dia e noite, macho e fêmea, doce e amargo, etc.
Nos seis meses em que é uma divindade masculina, é representado pelo arco-íris, sendo atribuído a Oxumarê o poder de regular as chuvas e as secas, já que, enquanto o arco-íris brilha, não pode chover. Ao mesmo tempo, a própria existência do arco-íris é a prova de que a água está sendo levada para os céus em forma de vapor, onde se aglutinará em forma de nuvem, passará por nova transformação química recuperando o estado líquido e voltará a terra sob essa forma, recomeçando tudo de novo: a evaporação da água, novas nuvens, novas chuvas, etc.
Nos seis meses subsequentes, o Orixá assume forma feminina e se aproxima de todos os opostos do que representou no semestre anterior. É então, uma cobra, obrigado a se arrastar agilmente tanto na terra como na água, deixando as alturas para viver sempre junto ao chão, perdendo em transcendência e ganhando em materialismo. Sob essa forma, segundo alguns mitos, Oxumarê encarna sua figura mais negativa, provocando tudo que é mau e perigoso.
Não podemos nos esquecer de que tanto na África, como especialmente no Brasil, a população negra, foi continuamente assediada pela colonização branca. Uma das formas mais utilizadas por jesuítas para convencer os negros, era a repressão física, mas para alguns, não bastava o medo de apanhar. Eles queriam a crença verdadeira e, para isso, tentaram explicar e codificar a religião dos Orixás segundo pontos de vista cristãos, adaptando divindades, introduzindo a noção de que os Orixás seriam santos como os da Igreja Católica. Essa busca objetiva do sincretismo sem dúvida foi esbarrar em Oxumarê e na cobra - e não há animal mais peçonhento, perigoso e pecador do que ela na mitologia católica.
Por isso, não seria difícil para um jesuíta que acreditasse sinceramente nos símbolos de sua visão teológica. Reconhecer na cobra mais um sinal da presença dos símbolos católicos na religião dos Orixás e nele reconhecer uma figura que só poderia trazer o mal.



Na verdade, o que se pode abstrair de contradições como as que apresentam Oxumarê é que este é o Orixá do movimento, da ação, da eterna transformação, do contínuo oscilar entre um caminho e outro que norteia a vida humana. É o Orixá da tese e da antítese. Por isso, seu domínio se estende a todos os movimentos regulares, que não podem parar, como a alternância entre chuva e bom tempo, dia e noite, positivo e negativo. Conta-se sobre ele que, como cobra, pode ser bastante agressivo e violento, o que o leva a morder a própria cauda. Isso gera um movimento moto-contínuo, pois, enquanto não largar o próprio rabo, não parará de girar, sem controle. Esse movimento representa a rotação da Terra, seu translado em torno do Sol, sempre repetitivo- todos os movimentos dos planetas e astros do universo, regulados pela força da gravidade e por princípios que fazem esses processos parecerem imutáveis, eternos, ou pelo menos muito duradouros se comparados com o tempo de vida médio da criatura humana sobre a terra, não só em termos de espécie, mas principalmente em termos da existência de uma só pessoa. Se essa ação terminasse de repente, o universo como o entendemos deixaria de existir, sendo substituído imediatamente pelo caos. Esse mesmo conceito justifica um preceito tradicional do Candomblé que diz que é necessário alimentar e cuidar de Oxumarê muito bem, pois, se ele perder suas forças e morrer, a consequência será nada menos que o fim da vida no mundo.
Seu domínio se estende a todos os movimentos regulares que não podem parar, como a alternância entre o dia e a noite, o bom e o mal tempo (chuvas) e entre o bem e o mal (positivo e negativo).
Enquanto o arco-íris traz a boa notícia do fim da tempestade, da volta do sol, da possibilidade de movimentação livre e confortável, a cobra é particularmente perigosa para uma civilização das selvas, já que ela está em seu habitat característico, podendo realizar rápidas incertas.
Pierre Verger acrescenta que Oxumarê está associado ao misterioso, a tudo que implica o conceito de determinação além dos poderes dos homens, do destino, enfim: É o senhor de tudo o que é alongado. O cordão umbilical, que está sob seu controle, é enterrado geralmente com a placenta, sob uma palmeira que se torna propriedade do recém-nascido, cuja saúde dependerá da boa conservação dessa árvore.

A Run Boboi!

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Ìyá-Wa - A virgem

Também conhecida como Ìyá-Wa. Assim como Odoyá e Oxum, também é uma divindade feminina das águas e, às vezes, associada à fecundidade. É reverenciada como a dona do mundo e dona dos horizontes. Em algumas lendas aparece como a esposa de Oxumarê e pertencendo a ela a faixa branca do arco-íris, pelo raio do sol, pela neve, em outras como esposa de Obaluaiê ou Omulu.
Ewá é a divindade do rio Yewà. Na Bahia é cultuada somente em três casas antigas, devido à complexidade de seu ritual. As gerações mais novas não captaram conhecimentos necessários para a realização do seu ritual, daí se ver, constantemente, alguém dizer que fez uma obrigação para Ewá, quando na realidade o que foi feito é o que se faz normalmente para Oxum ou Iansã.
O desconhecimento começa com as coisas mais simples como a roupa que veste as armas, insígnias que segura e os cânticos e danças, isso quando não dizem que Ewá é a mesma coisa que Oxum, Odoyá e Oyá.
Orixá que protege as virgens  aliás, tudo que é inexplorado conta com a sua proteção: a mata virgem, as moças virgens, rios e lagos onde não se pode nadar ou navegar. A própria Ewá, acreditam alguns, só é iniciada na cabeça de mulheres virgens, pois ela mesma seria uma virgem, a virgem da mata virgem filha dileta de Oxalá e Odùduwà.
As palmeiras com folhas em leque também simbolizam Ewá - exótica, bela, única e múltipla.
Na verdade ela mantém fundamentos em comum com Oxumarê, inclusive dançam juntos, mas não se sabe ao certo se seria a porção feminina, sua esposa ou filha.
Quando cultuada na nação Keto, Ewá dança ilu, hamunha e aguerê, Na cultura Djedje, onde suas danças são impressionantes, prefere o bravun e o sató e dança acompanhada de Oxumarê, Omolu e Nanã.


Nas festas de Olubajé, Ewá não pode ser esquecida, deve receber seus sacrifícios, e no banquete não pode faltar uma de suas comidas favoritas; banana-da-terra frita em azeite.
Ewá tem o poder da vidência, atributo que o deus de todos os oráculos, Orunmilá lhe concedeu, Sra. do céu estrelado rainha dos cosmos. Ela está no lugar onde o homem não alcança.
Sua ferramenta é o arpão, pode também carregar um ofá dourado, ou uma serpente de metal.
O Orixá Ewá é uma bela virgem que Xangô também se apaixonou, porém não conseguiu conquistá-la, Ewá fugiu de Xangô e foi acolhida por Obaluàyé que lhe deu refúgio. Ewá mora nas matas inalcançáveis, ligada a Irôko e Odé, e tornou-se uma guerreira valente e caçadora habilidosa. Ewá é casta, a Senhora das possibilidades.
Na África, o rio Yewà é a morada desta deusa, mas a sua origem gera polémica. Há quem diga que, tal como Oxumarê, Nanã, Omulu e Irôko, Ewá era cultuada inicialmente entre os Mahi, foi assimilada pelos Iorubas e inserida no seu panteão. Havia um Orixá feminino oriundo das correntes do Daomé chamado Dan. A força desse Orixá estava concentrada numa cobra que engolia a própria cauda, o que denota um sentido de perpétua continuidade da vida, pois o círculo nunca termina.
Ewá teria o mesmo significado de Dan ou uma das suas metades – A outra seria Oxumarê. Existem, no entanto, os que defendem que Ewá já pertencia à mitologia Nagô, sendo originária na cidade de Abeokutá.


             Ri Ro Ewá!

Obasy - A Guerreira destemida

Obá, Orixá africano do Rio Obá ou rio Níger, terceira esposa de Xangô, identificada no jogo do merindilogun pelos odu odi, obeogunda e ossá.
Guerreira, veste vermelho e branco, usa escudo, Ofá (Arco e flecha). Obasy é a senhora da sociedade Elekô, porém no Brasil esta sociedade passou a cultuar egungun. Deste modo, Obasy é a senhora da sociedade Lésé-Orixá. Obá representa as águas revoltas dos rios. As pororocas, as águas fortes, o lugar das quedas são considerados domínios de Obá. Ela também controla o barro, água parada, lama, lodo e as enchentes. Trabalha junto com Nanã. Representa também o aspecto masculino das mulheres (fisicamente) e a transformação dos alimentos de crus em cozidos. É também a dona da roda. Orixá, embora feminina, energética, temida, e forte, considerada mais forte que muitos Orixás masculinos, desafiando a luta Oxalá, Oyá, Oxumarê, Exú e Orunmilá.
Obá foi à terceira mulher de Xangô. Ao contrário do que muitos pensam a lenda de que Obá cortou a orelha por causa da mentira de Oxum está incorreto, na verdade, Obá apenas cortou sua orelha para provar seu amor a Xangô. Quando manifestada, esconde o defeito com a mão. Seus símbolos são espada, escudo, ofá e erukerê.
            Segundo suas lendas, Obá lutou contra inúmeros Orixás, derrotando vários deles. Obá teria derrotado Exú, Oxumarê, Omolu e Orunmilá, e tornou-se temida por todos os deuses, tendo sido derrotada apenas por Ogun e tornando assim sua esposa e ao lado de Ogun quando este foi enfrentar Xangô em batalha ela se encantou por Xangô e abandonou a luta ao lado de Ogun e se entregou a Xangô como mulher vivendo uma grande paixão. Obá nunca havia visto alguém como Xangô, ela via nele tudo o que sonhava para si.
Existem algumas versões do grande encontro de Xangô e de Obá, em uma dessas versões ela é a líder de todas as mulheres e a rainha de Elekô, mas em todas, as evidências dizem que o amor entre os dois era desmedido e que nada ofuscava a relação dos dois, da união dos dois nasceu Opará, Orixá confundida com Oxum.
A união de Xangô e Obá Transcorre um culto nos arredores da cidade, é Elekô. Uma sociedade restrita, onde apenas mulheres realizam o culto. Possui como matriarca a temida Obá, a fundadora desta sociedade que cultua a ancestralidade feminina individual. Nem um homem poderia sequer assistir o ritual secreto, sendo punido por Obá com sua própria vida. Certo dia, em uma das noites de culto, Xangô caminhava alegremente e dançava ao som do batá. Quando percebe, ao longe um aglomerado de mulheres, realizando uma cerimônia sob as ordens da enérgica Obá.
Xangô era muito curioso e não se conteve aproximando-se da cena, ficando a espreita. Xangô encantou-se com a rara beleza de Obá, que apesar de não ser tão jovem era a mais bela mulher que ele já vira. No momento de distração, Xangô foi percebido e cercado pelas mulheres, foi levado à presença da grande deusa, que lhe falou o preço que haveria de pagar por sua audácia em violar o culto sagrado de Elekô. Mas a própria Obá que se encantou com a inigualável beleza de Xangó apaixonando-se de imediato, relutou em aplicar a sentença de morte e usou de sua supremacia no culto para ditar nova regras, dando nova chance a Xangô: "Todo homem, que violar o culto, se for do agrado, da senhora do culto, deverá unir-se a ela como marido ou aceitar a pena de morte" Xangô não pensou duas vezes, seria poupado da sentença e ainda assim possuiria a grande deusa por quem havia se apaixonado.


A cerimônia de união de Xangô e Obá foi realizada dentro dos limites de Elekô. Foi o inicio de uma grande paixão, nunca se viu tanto amor. A deusa guerreira e justiceira que pune os homens que maltratam as mulheres descobriu um sentimento novo por um homem além do ódio. Descobriu todo o amor que um homem pode dar. A grande rainha de Elekô, a rainha de Xangô aprendeu a amar e ser amada. Nasce dessa grande paixão, uma criança, uma menina, nasce Opará, nasce a mais bela, justiceira e feroz guerreira. Herdou o melhor do pai e da mãe e prosseguiu com o culto.
Embora, em suas lendas, Obá tenha se transformado em um rio ela também é relacionada ao fogo e é considerada por muitos como o Xangô fêmea. Obá é saudada como o Orixá do ciúme, mas não se pode esquecer que o ciúme é o coronário inevitável do amor, portanto, Obá é a deusa do Amor e da Paixão incontrolável, com todos os dissabores e sofrimentos que o sentimento pode acarretar. Obá tem ciúme porque ama. Obá é a deusa da guerra e do poder, seu culto está relacionado ao rio Obá, às águas em seu culto faz referência ao poder, a força incontrolável das águas. Seu culto no Brasil é confundido ao de Oyá, alguns chegam a insinuar que elas sejam irmãs, o que é uma inverdade, outros dizem que Obá seria uma Oyá mais velha, o que é mais absurdo ainda. Por existir esta confusão, alguns acreditam que Oyá além de ser uma divindade da água e relacionada ao vento, teria ligação com o fogo, mas Oyá não possui ligação com o fogo Obá sim.
Obá quando em fúria transborda, agita-se. Tudo relacionado à Obá é envolto em um clima de mistérios. Obá era cultuada como a grande Deusa protetora do poder feminino, por isso também é saudada como Ìyà-Agbà e mantém estreitas relações com as Ìyà-Mi.
Obá é a Ìyà-Egbé, ela é a Ìyà-Àbíkú, desta forma é ela a encarregada de enviar ao mundo as crianças que nascem como castigo para seus pais. O lado esquerdo (Osì) sempre esteve relacionado à mulher e, por uma razão muito elementar, é o lado do coração. Quando Obá é saudada como guardiã da esquerda, isso quer dizer que é a guardiã de todas as mulheres, aquela que compreende os sentimentos do coração, pois Obá pensa com o coração, por isso dança sempre com a mãe esquerda apontando para o lado esquerdo na altura da orelha, poder genitor feminino.
Ligada a Odé (Oxóssi) pela caça e grande arqueira, ligada a Xangô através do fogo a luta pela vida.

Como pode uma deusa ligada a esses sentimentos, dedicar-se à guerra? Toda a energia das suas paixões frustradas é canalizada por ela para a guerra, tornando-se a guerreira mais valente, que nenhum homem ousa enfrentar. Obá supera a angústia de viver sem ser amada.

Obá troca um palácio por uma cabana, troca todas as riquezas do mundo por uma frase: “Eu te amo”. 



Obà Siré!

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Kitembo - A bandeira funfun


Tempo é um orixá originário de Íwerè, região que fica ao leste de Òyó na Nigéria, tão importante que ele é um orixá.
Tem um dito que diz "O tempo dá, o tempo tira, o tempo passa e a folha vira", muitas vezes precisamos que o tempo nos seja favorável, e outras não, quero dizer, precisamos de tempo curto ou longo, com o bom uso do tempo, muitas coisas se modificam, ou podemos modificar.
Tempo tem um temperamento estável, de caráter firme e em alguns casos violento.
Tempo é cultuado numa árvore a gameleira-branca, que fica acentuado o caráter reto e firme do orixá pois suas raízes são fortes, firmes e profundas. 
É representado, nas casas de Angola, por um mastro com uma bandeira branca (funfun), tambem chamada de Bandeira de Tempo.
Em geral na frente das grandes casas de Candomblé, existe uma grande árvore com raízes que saem do chão, e são envoltas com um grande Alá (pano branco), este é Tempo, que é tido com árvore guardiã da casa de Candomblé pois ter esta árvore plantada no terreno da casa de Candomblé representa força e poder.
Quatro é o número da Terra; quatro foram os dias que Olorum levou para criar o mundo; a cada dia, quatro são as estações do ano: verão, inverno, outono e primavera; quatro são os elementais da natureza: fogo, água, terra e ar. Ligado a este numero quatro, está o Orixá Tempo – de origem Angola e Congo – semelhante ao Irôko, da Nação Ketu e a Loko, de Nação Djedje .
Tempo é o senhor das estações do ano; regente das mutações climáticas. Pai da Maiongá, o banho da Nação Angola.
Tempo está sempre em movimento, entre uma e outra extremidade dos polos. Ora está em Exu – equilíbrio negativo do Universo – oras está em Oxalá – equilíbrio positivo do Universo – ora intermediário entre um e outro polo. Tempo é equilíbrio e desequilíbrio, ao mesmo tempo. Ele é o segundo, o minuto, a hora.
Nas casa de Angola, Tempo é reverenciado com o Pai da Maiongá, do banho, que vai purificar o corpo dos seguidores e iniciados no culto, no momento de maior energia, e vibração deste Inkice (Orixá). Momento, também, de maior purificação, feita através do banho com ervas, água do mar, de cachoeira, de rio, de mina e de chuva, etc.
Tempo está ligado ao meio ambiente, pois qualquer choque ambiental tem a sua regência. Ligado intimamente aos quatros elementais da Natureza, Tempo viaja por todos eles, num movimento constante, alterando infinitamente o  tempo. Sem esse movimento, viveríamos o mesmo segundo sempre, melhor, “sempre” não existiria. Com o tempo parado, não poderia existir vida de nenhuma espécie. A este Orixá, também chamado de Kitêmbo, foi designado e controle do ambiente, a passagem dos segundo, minutos e horas, dando sentindo aos dias, semanas, meses, anos, décadas, séculos e milênios. Ele é o próprio nome: Tempo.


Tempo (Kitêmbo) rege as estações do ano, como já disse. Ele é o responsável pela passagem de um a para outra. Está ligado ao frio, ao calor, à seca, às tempestades, ao ambiente pesado e ao ambiente agradável;
Tempo é o outono: período de mudança das plantas, dos ventos fortes, do clima meio nublado, sem beleza, mas de fundamental importância para o surgimento de um novo ciclo de vida.
Tempo é inverno: período de frio, chuvas permanentes, ambiente gelado e úmido.
Tempo é verão: período de forte calor, de sol escaldante, de seca, de estiagem.
Tempo é primavera: período da beleza das plantas, do nascimento e do desabrochar das flores, do clima agradável, do frio gostoso e do sol morno, sadio; período em que a Natureza é mais colorida e talvez mais bela de ser ver.
Tempo é o passeio por todas essas estações. Ele se encanta na mudança brusca de clima, do popular: “sol e chuva, casamento de viúva”. Tempo é a mudança radical e a mudança proporcional do clima.
Kitêmbo é a escala do tempo, por isso sua ferramenta é uma escada, em referencia ao crescimento do tempo em nossa volta. É a energia em constante deslocamento nos quatro pontos cardeais: norte, sul, leste e oeste. Viaja pelos quatro, constantemente, sem parar. E nem poderia!
Os Angolas e os Congos, que cultuam os antepassados, contam uma historia sobre esse Inkice (Orixá). Relatam que ele era um homem muito agitado, que resolvia varias coisas ao mesmo tempo e que realiza varias tarefas de uma só vez.
Reclamava, entretanto, que o dia era muito pequeno e que não conseguia realizar tudo aquilo que desejava, nos prazos estabelecidos por ele mesmo. Reclamava demais. Cobrava de Zambi (Oxalá nas nações  Angola e Congo) ter nascido lento e incapaz de realizar tudo o que pretendia, mesmo que, na realidade, fosse um homem forte, veloz, astuto e competente. Mesmo assim, não se considerava capacitado para realizar seus objetivos e acusava Zambi de ter feito o dia muito pequeno.
Um dia, Zambi lhe disse:
- Você e muito afoito. Parece que errei em sua criação, pois você não se conforma com o eu feito.
E ele retrucou  a Zambi:
- Não tenho culpa se o Senhor, Pai, fez  o dia tão pequeno. As horas são tão miúdas que não dá tempo para realizar tudo àquilo que planejo!
E Zambi, aborrecido, mas admirado pela coragem do seu filho, determinou então:
- Já que você considera que o tempo é pequeno, passará, então, a controlá-lo e administrando o verão, o inverno, o outono e a primavera. Andará, então, pelo fogo, pela água, pela terra e pelo ar. Não terá, mas problemas de tempo. Será,  então conhecido com Tempo e regerá os movimentos da Natureza.
E, na terra, o povo clama o seu Inkice entoando a cantiga:

“E Tempo Zará... e Tempo Zará Tempo ô!
E Tempo para trabalhar...
“E Tempo Zará... e Tempo Zará Tempo ô!
E Tempo para comer...
“E Tempo Zará... e Tempo Zará Tempo ô!
E Tempo para beber...
“E Tempo Zará... e Tempo Zará Tempo ô!
E Tempo para viver...”

            Poderia eu falar mais desta maravilhosa e tão importante força da Natureza mas, no momento, falta-me tempo!


           Zará Tempo, Tempo Zará!